PASSO A PASSO

Do telefone avisei : "Tô saindo".
As vozes se calaram e o som foi pro gancho.
Os apartamentos se agitaram assim como os preparativos.
A camiseta e o tênis me fizeram sentir nas nuvens, para combinar com o lugar que vou.
Ajeita o cabelo que caiu no rosto, depois de abaixar o fone, passa o pé, quase por cima da mesa de centro, destino quarto.
Nos ponteiros do relógio, dez minutos para o combinado, menos o tempo de pegar a chave e o som, enquanto passa um leve batom.
Uma blusinha na frente da saia, já colocada, uma outra que vai pra cama, pois não combina nada com nada, junto com a chave do armário.
Fechei a porta, mais ou menos setenta passos e outras duas portas, abertas e fechadas, me olhei no espelho enquanto fazia o mesmo em casa.
Um par de sapatos no pé, agora já combinando tudo, um brinco na orelha dali, um anel daqui, tentei três vezes, dar partida no carro, pegou e saí.
Deu a última olhada, meio de costas, no espelho, um pé saiu do quarto o outro ficou chamando outra vez todo o corpo para um detalhe.
Detalhes, rolava no som que acabara de colocar no carro, enquanto olhava para a esquina oposta, aonde virei o carro, engatei a segunda e fui.
No meio do caminho, pessoas indo e vindo, uma criança segurando na mão da mãe antes de atravessar, passei e deixei o momento no tempo.
Seus pés, outra vez, saíram agora juntos do quarto, te levaram até a mesa perto da televisão que gritava querendo atenção, mas nem sintonizou.
A longa música continuava enquanto eu passava da metade do caminho, agora já passado, indo para um futuro dali bem próximo.
Agora só resta sentar e esperar - Pensava, enquanto dava a volta naquela mesa do centro onde havia passado por cima, mas nem deu tempo.
O interfone tocou e quando atendeu, sem surpresa alguma, lá estava eu, banho tomado, carro parado e a um minuto de estar ao seu lado.
Estou descendo - Falou e repetiu o gesto de arrumar o cabelo que insistentemente vêm ao rosto com o movimento. Minha vez de esperar.
Gira a fechadura, giro minha cabeça para ver o movimento na rua, passos na escada, enquanto eu, de cabeça, outra virada. Chegou, senti, vi.
Vi o vulto, um pouco confuso e distorcido pelo vidro da porta do prédio, mas o cheiro já escapava e exalava pelo buraco da mesma porta.
A porta abria, com ele também o meu sorriso, sua presença irradia e ela me contagia, mas nem dá muito tempo de sentir por que aí sempre vêm o beijo.
Ah...aquele beijo...que faz com que tudo aquilo que é rotina e que demora a passar, nem seja notado, pois nesse momento é o que menos importa.
Importante é justamente fazer esquecer o que é importante e proporcionar uma espécie de transe, onde tudo paralisa e resta somente nós.
Tudo se repete, alguma coisa sempre vai cair na rotina, assim também é o meu gostar, rotineiro, atravessa dias, se repete e inexplicavelmente não muda.
Para mim, também é estranho, mas é muito bom assim e se pudesse mudar alguma coisa, seria somente às vezes em que tento dar partida no carro.

FF

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