CADARÇO SOLTO

Se naquela noite, eu tivesse parado para amarrar o tênis, nada disso teria acontecido. Pois eu não teria te conhecido.
Daquela noite, até algumas atrás, procuro voltar no tempo. Que sei, de forma alguma, volta mais.
Evitaria ter comprado o vinho, que devagarinho, preparava o ninho para eu me deitar.
Evitaria ter te acompanhado até a porta para fechar, sem saber que a do meu peito iria arrombar.
Evitaria o dia seguinte, esperando para na hora certa ligar, sem atrapalhar, já desconfiando que, do outro lado da linha, ansiosa também me esperava ligar.
Mas que, para fazer o jogo, por um instante fez nem se lembrar.
Evitaria os passeios, os anseios, os filmes, a realidade e as mesmas idéias, apesar da diferença de idade.
Evitaria as noites no portão, as conversas sentados no chão, o resumo da vida dos familiares, o eterno ciúme do irmão, que mesmo longe, se fazia presente na mente, enquanto uma lágrima também ia ao chão.
Evitaria aquele reveillon, que mesmo sem nada, foi muito bom. Os amigos que viraram em comum e os desentendimentos que não ocorreram sequer um.
Evitaríamos meses de indecisão sobre ir ou ficar, evitaríamos mudanças de humor e de lugar.
Voltaríamos nas horas e ficaríamos mais alerta, mesmo sabendo que tudo têm a hora certa. Hora errada, só as iguais a essa que não me deixam em paz por nada.
A conversa, ao som de violão, num fundo de bar não volta. Nem o passeio de carro, sem destino, depois de fechar a porta.
A praia sem luz, mas com muito fogo e calor, também não regressa. Mas outras dessas virão, sem pressa.
Virão para mostrar que o futuro é melhor que o passado, e que só não parei para amarrar o tênis, por que ele não estava desamarrado.
Era para ser assim, e não teve nada de errado.

FF

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